ANÁLISE: UFC 143 - Condit VS Diaz
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ANÁLISE: UFC 143 - Condit VS Diaz



Esse UFC 143 começou fantástico e terminou melancólico. Lá no fundo do abismo das preliminares, quando nem todos os holofotes foram acesos e a pipoca ainda nem ficou ponta, lá na primeira luta que muitos nem vêem porque não chegaram em casa ou no estádio, explodiu uma supernova no chute Stephen Thompson, um dos strikers mais fantásticos do planeta, invicto e convicto de já ser um dos melhores sem ninguém ainda saber. Enquanto no evento principal duas estrelas não foram suficientes para emitir o menor brilho. O eterno dilema de tática VS. raça, estratégia VS. coração tem um de seus capítulos mais polêmicos imortalizado no tango de Diaz e Condit. Um dando passos pra frente, outro dando passos pra trás, bailando num ritmo nada eficaz e muito longe do que cada um é capaz.

Carlos Condit VS Nick Diaz

Ir dormir às 4 da manhã frustrado por uma péssima luta entre dois dos maiores do mundo pode encher nossos corações de idéias vis e depreciativas, mas em nome da razão devemos tomar as rédeas desses sentimentos. Afirmar que Nick Diaz só quer trocar porrada e luta como brigador de bar, ou que Condit correu do combate, são duas afirmações inverídicas e ingratas. Só quem entende o que vê, compreende o que sente. Condit tem 28 vitórias, 26 nocautes ou finalizações e Diaz 26 vitórias, com 21 acabando antes do tempo regulamentar. São dois dos lutadores mais agressivos que esse esporte já produziu e vão continuar no topo, ganhando bônus de luta, nocaute ou finalização da noite. E teria sido essa uma luta incrível não tivesse Condit resolvido usar da maldita estratégia. Podia ter partido pra cima, para troca franca e tinha grande chance de vencer, mas optou por seguir a risca o plano, matar o improviso, sacrificar a alma fervente do combate em troca de uma fria vitória. Tudo isso é verdade e mesmo assim, foi o claro vencedor do combate. Em um esporte com regras, podemos criticar quem se atém a elas de modo justo e sem criatividade, mas não desmerecê-lo. Dentro dos critérios de avaliação vigente em MMA, Carlos venceu.

Nick Diaz nasceu para o combate. Não gosta da fama ou entrevistas, odeia o adversário para amar lutar. Se você sangrar, ele fareja, se fizer ele sangrar, entra em frenesi. É uma criatura unilateral, um ídolo improvável e relutante, um dos poucos defensores de um estilo antigo de lutadores que caiam dentro mesmo, sem plano B ou C. Treinam de tudo e vão pro pau. Apanha, bate, da show, mancha a lona, rasga a carne e vence muito mais do que perde. Não desenvolveu o falso respeito pelos atletas companheiros de trabalho que tanto mata a sinceridade das declarações hoje em dia. Foi posto nesse mundo para vencer St.Pierre, é seu destino, ele sabe, nós sabemos. Mas tinha uma pedra no meio do caminho.

Carlos Condit é elite. Tem plano de A a Z e frieza e disciplina de samurai. Entende que para chegar a um objetivo primeiro deve se conhecer os vários caminhos, e a diferença entre certo ou errado, covarde ou ousado, pode estar no resultado final. Não desestabiliza mentalmente, não perde o foco. Mesmo em silêncio ou movimentos laterais sua katana está sempre meio fora da bainha. São os outros que tendem a se desesperar em sua aparente indiferença que costuma vir seguida de soco na cara e nocaute.

Uma pequena coisa impediu dois dos trocadores mais agressivos e incansáveis, no momento mais próximo da realização de seus sonhos, de protagonizarem uma luta inesquecível: estratégia. Diaz aceita a troca, abaixa a guarda, chama pra dentro, aceita a luta de solo onde é incrível, mas tem dois defeitos que nunca pensou em corrigir. Dificuldade em encurtar e em derrubar. Quase todas as lutas que vence, ou o adversário aceitou a troca franca, permitindo assim que ele se aproximasse e dizimasse, ou o derrubou para evitar o pau e acabou finalizado. Para Greg Jackson foi um código fácil de quebrar. Era só manter a distância que Diaz não conseguiria se aproximar para ser letal e muito menos derrubar. O mais difícil era fazer Condit, que só luta andando para frente, aceitar e conseguir ser eficaz andando para traz. Algumas pessoas tem dificuldade em abrir a mesma porta só porque mudou a maçaneta, imagine alterar todo o estilo de luta para um combate. Tem que ser extremamente talentoso, de várias valências técnicas e com muita disciplina para executar um plano assim. E é isso que um ?natural born killer? faz. Estuda a presa e executa. A história é contada pelo vencedor.

Muito da crítica a sua performance vem por não ter se chocado com Diaz no meio do octagon até um cair. Lembro que Sugar Ray Leonard e Muhammad Ali, dois dos maiores boxers de toda a existência, lutavam caminhando para trás. Chuck Liddell e Lyoto Machida, também. Caminhar para trás é apenas uma opção de movimentação. A diferença entre fugir ou evadir está na eficácia dos contragolpes. Kalib Starnes correu a luta toda de Nate Quarry. Fugiu dos golpes e não desferiu nenhum. Era um tentando bater e o outro tentando não apanhar. Quem acha que viu isso em Condit VS. Diaz deveria rever a luta, e se ainda achar a mesma coisa admitir que sofre de avançado caso de amor platônico. Condit desferiu 159 golpes (acertou 151). Desses, alguns foram joelhadas voadoras, cotoveladas giratórias e um chute na cabeça que só não apagou Diaz, porque Diaz nunca apaga. E isso porque foi elusivo o tempo todo, porque evitou o combate, imagine se tivesse atacado. Diaz desferiu menos golpes e acertou menos (117/105). Desmerecer o ex campeão do WEC é tirar o mérito do ex campeão do Strikeforce.

Uma luta dessa importância e tão complicada de julgar polariza as torcidas. Diaz entrou e foi pra cima, como sempre faz, foi predador, irracional, um animal, uma fera selvagem. Condit foi caçador, calmo, racional. Na tentativa de provar sua opinião a correta, muitos buscam suporte na opinião de outros. Anderson Silva achou que Diaz ganhou, mas Anderson também achou que Minotouro venceu Bader. O pessoal envolvido no jiu-jitsu tende a apoiar Diaz, apesar de Diaz ser basicamente um striker atualmente. Intrigante. Lembro de Vitor Belfort após vencer o torneio do UFC nocauteando Tra Telligman e Ferrozo, gritar de todo pulmão: jiu-jitsu! Fato é que aquele que andou para trás desferiu mais golpes, acertou mais golpes contundentes, diversificou mais os ataques e feriu mais o adversário. Diaz não conseguiu fazer nada do que planejou, Condit fez exatamente o que queria. Vitória da estratégia e derrota da emoção.

Há um ditado japonês que diz para tomarmos cuidado com o que desejamos, porque pode virar realidade. Diaz adoraria uma revanche, mas se Condit entrar com os gametas fervilhando de ódio e partir pra cima, são grandes a chances de Diaz só poder reclamar do resultado quando acordar na cama do hospital.

Torci por Diaz porque acredito que é o único com chances reais de desmoralizar Georges St.Pierre e aplacar de vez a tentativa do canadense transformar MMA em álgebra. Mas a minha torcida por um jamais me fará fechar os olhos para o mérito do outro.

Diaz e seus admiradores afirmam que ele é um lutador de verdade e que entrou para lutar, diferente do adversário, mas desmereceu o campeão ao final. Lutador de verdade é mais do que aceitar porrada. Quem aceita porrada é porradeiro, raçudo. Lutador de verdade tem disciplina, respeito pela arte que pratica, pelos mestres que teve e por aqueles que o superam sem trapaça. Se o adversário é um covarde, pior para Diaz que não vence nem um covarde preso com ele numa jaula por 25 minutos. Entrou, teve performance de grande lutador, mas saiu como moleque. Choramingando e dizendo que não brinca mais. Pelo esforço todo, merecia pelo menos um bom bom e uma medalhinha de honra ao mérito, porque o cinturão está nos ombros de Carlos Condit e lá vai ficar.

Fabricio Werdum VS Roy Nelson

Tem um certo azedume toda análise minha das lutas de Werdum. Nunca pareceu astralmente justa sua vitória sobre Fedor Emelianenko, apesar de cheia de méritos. Um lutador mediano não deveria ser o escolhido pelo destino para mancar o galope imbatível do maior de todos os tempos. Ou talvez esteja sendo poético demais, e Werdum tenha apenas colhido os frutos de treino e dedicação enquanto o russo se apresentava gordo e obsoleto. Fato é que passou de um incrível lutador de chão com uma trocação medíocre escondida atrás de mãos pesadíssimas e se jogar no chão para fugir dos golpes de Overeem no Strikeforce, para trocação refinada e brutal em uma luta. De sua última para essa contra Roy Nelson, vimos versão extremamente melhorada de contundência em pé. Seu treinador Rafael Cordeiro transformou o canivete em baioneta. Apertou os parafusos de seu boxe e lubrificou o encaixe de seu muay thai. Werdum lembrou Wanderlei Silva como se grampeia uma nuca e desce o joelho. Só não venceu por nocaute no primeiro round porque Nelson gosta de apanhar. Se não gostasse teria urrado de dor e entregue o combate. Apenas raça não é suficiente para agüentar esse nível de punição sem chance de fuga.

Roy Nelson é um péssimo exemplo. Tem vários fãs que se identificam com sua barriga e jeito desleixado, mas isso não é bom para o esporte. Obeso, lento, não consegue colocar em prática seu jiu-jitsu por perder em movimentação para quase qualquer adversário, e não consegue aplicar com eficácia sua pesadíssima mão, por não ter aceleração. Resta fazer uso de seu super poder masoquista de agüentar dano indefinidamente. Até esboçou lutar por cima de Werdum, mas ter o braço quase estalado o fez mudar de idéia.

Se é verdade que Werdum traz novas qualidades, também é que arrasta os mesmos defeitos. Seu gás acaba antes do fim do primeiro round e é extremamente econômico na ousadia. Assim que acha que está na frente por pontos, para de agredir. Se joga no chão e caminha sem desferir golpes nem em contra ataque. Foi necessário um segundo round parelho contra Roy para que resolvesse voltar a lutar no terceiro. Se Werdum fosse sempre como é nos primeiros 3:43 minutos de cada luta, seria um dos mais perigosos do mundo. Uma luta sua contra Frank Mir lhes cairia bem. Para Roy não há nenhum caminho claro. Descer para o meio pesado poderia ser bom para sua carreira e diminuiria suas chances de sofrer um micro enfarto fulminante.

Renan Barão VS Scott Jorgensen

Renan Barão só tem uma derrota e faz tanto tempo que nem se lembra, mas seu sangue é real e seu destino é ser campeão, seja no peso galo ou no mosca, caso não supere a genialidade e demência de Dominick Cruz e tenha que descer. Ele encontrará um caminho. Teve uma apresentação apenas mediana e mesmo assim tirou o ultra competitivo Scott Jorgensen pra figurante. Ombros fechados, socos em linha, chutes invisíveis de velozes e jiu-jitsu na ponta da navalha. Barão é demais para quase qualquer adversário do seu peso.

Jorgensen fez o que pode, mas Barão pode tudo. Foi melhor na trocação e no chinch. Venceu sem grande esforço um dos melhores que o peso tem a oferecer. Com os dois únicos capazes de lhe incomodarem já com luta marcada, Cruz Vs Faber, vai passear sobre outro adversário que o UFC ache digno e avançará sobre o cinturão no final de 2012. Scott deveria descer e tentar se reinventar no peso mosca, ainda bem carente de estrelas.

Matt Brown VS Chris Cope

Até essa luta Matt Brown vinha de 4 derrotas em 5 combates. E mesmo finalizado em todas, continua de contrato ativo no UFC. Agora entendo bem o epelido ?the immortal?. Significa: ?amigo de Dana e Lorenzo?. Deve levar o peru na ceia de Natal, namorar a filha de um deles ou saber um segredo sinistro, não consigo achar outra explicação. Um lutador sem carisma e de qualidade questionável como esse figurar no evento, me faz questionar a suposta idoneidade dos organizadores ao afirmar trazer e manter os melhores do mundo. Brown pode pegar qualquer um, não importa o resultado. Ele sempre estará lá.

Cope entrou para apanhar. Com cartel de 5 vitórias e 3 derrotas já pode lutar por algum cinturão nos atuais eventos do Jungle Fight.

Alex Caceres VS Edwin Figueroa

Alex Caceres tem estilo, troca com categoria e precisão, tem um chão afiado, mas alguma coisa em seu sistema força a reinicialização toda hora. Não consegue dar seqüência. Em quase toda luta arruma um modo de parar de fazer o que vinha fazendo bem, ou continuar fazendo o que não vem dando certo. Nesse caso foram dois chutes direto no apito de plástico do adversário, pelos quais foi punido com a perda de 2 pontos. Um para cada filho que Figueroa jamais terá. Herrera e Gonzalez jamais nascerão.

Chutes internos causam extremo dano, tanto na musculatura da coxa quanto ligamentos do joelho, mas são de alto risco. Meses de treinamento com atleta de tamanho ou base ligeiramente diferente do oponente, pode fazer o golpe entrar em cheio no lugar errado. Cabe a quem desferiu mudar de tática antes de ser considerado infrator. Cáceres insistiu no erro, como sempre faz, e perdeu como adora perder. Assim, de modo besta. Quase sem merecer, quase sem mais nem menos.

Figueroa foi pior, mas mereceu vencer, Cáceres foi melhor e mereceu a derrota. Jamais conseguiria imaginar um combate que justificasse tal lógica. Figueroa ainda vai melhorar muito. É jovem e luta bem quando não está quase paralisado da cintura para baixo e Caceres vai sumir num mar de lutadores cheios de talento e sem disciplina.

OBS: Muitos estranharam Caceres ser punido com a perda de 2 pontos. Quando um atleta é advertido por um golpe ilegal que o juiz acha não ser intencional, na reincidência, perde 1 ponto. Quando o juiz considera que os dois golpes foram intencionais, tem liberdade para descontar 2.

Stephen Thompson VS Daniel Stittgen

Firas Zahabi, treinador de GSP, afirmou que Stephen é o melhor trocador do planeta, independente de esporte. O lobby é forte para o menino, e Firas é conhecido por dar esse suporte moral, por vezes exagerado a seus atletas. Mas fato que houve lampejos violentos de grandeza em sua breve apresentação nesse UFC 143. Guarda baixa, leve, quase sem tocar o chão, silencioso, letal, tão tranqüilo que parece frágil. Com mais de 40 vitórias e nenhuma derrota em kickboxing e invicto em MMA, Stephen erradicou seu primeiro adversário na organização. Dá um soco, abaixa a guarda, espera o contra golpe com os olhos abertos, a expressão relaxada de quem prevê o futuro, espera o alcance do adversário limitar o punho a milímetros de seu nariz para elevar a perna e nocauteá-lo com um tapa de pé na têmpora. Se com os punhos chamaríamos de overhand, podemos dizer que foi um overfeet. Contemplou o adversário cair com seus olhos que captam o universo em câmera lenta, e depois de milênios na sua contagem de tempo, deu um salto girado no ar e repousou de joelhos. Ninja Gaiden.

O UFC deve lhe oferecer para espancamento outro atleta de baixo nível como Stittgen, vindo de organizações menores, porém sem real pedigree. Precisa de tempo para amar MMA e desenvolver defesa de queda e luta de solo, não para misturar tudo e virar um hibrido sem alma, mas para poder se manter em pé, onde nasceu para estrelar e de onde ainda vai dar muitos espetáculos.



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