ANÁLISE: UFC 126 - Anderson VS Belfort
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ANÁLISE: UFC 126 - Anderson VS Belfort



Muitos fãs de futebol que viram Garrincha e Pelé jogarem dizem que depois disso ninguém foi realmente tão incrível. Outros dizem o mesmo de Fangio, Senna e Schumacher, Ali e Tyson e milhões dirão o mesmo sobre Anderson silva e Fedor Emelianenko com saudosismo daqui a anos. Num dos três melhores UFCs da década presenciamos mais uma apresentação com a assinatura do maior lutador que já caminhou sobre um octagon, a consolidação de um dos prováveis melhores lutadores de todos os tempos em Jon Jones e ainda Kid Yamamoto e Donald Cerrone escondidos que nem brinde de sucrilho nas preliminares.

Anderson Silva VS Vitor Belfort

Para os mais jovens e desinformados Vitor é um lutador de boa aparência, que aparece no Faustão, fez ponta em Malhação, marido da ex feiticeira e que iria ?acabar com a marra? de Anderson. Para os mais antigos ele é bem mais do que isso.

Belfort nunca foi nocauteado, nunca foi posto para dormir. As vezes que perdeu por nocaute técnico é porque seu coração desistiu antes do queixo. Por algum motivo tem como habito se desinteressar pela luta quando ela se estende ou há muito atrito. Simplesmente deixava pra lá. Nunca foi conhecido como um lutador raçudo ou perseverante. Sempre que Belfort foi realmente atingido no rosto, perdeu a luta. Mas quando ele ainda está aceso, quando ainda está querendo estar ali, ele é quase imbatível. Tem o melhor boxe em MMA de todos os tempos, desde quando MMA ainda estava em estágio embrionário sob o apelido de vale tudo ainda não apareceram 3 lutadores com mais poder de nocaute do que ele, em qualquer categoria de peso. Excelente faixa preta de jiu-jitsu, excelente quedas e defesa de quedas, Belfort é o fenômeno. Um atleta completo e devastador enquanto ainda está focado na luta. E ele nunca esteve tão focado, querendo tanto uma vitória, tão ligadão nos reatores, tão vidrado e preparado quanto esteve nos poucos minutos em que coexistiu com Anderson no octagon.

Ele não foi nocauteado quando já tinha dado sua famosa esmorecida, ou quando seu gás ou meta haviam se tornado tênues. Ele foi desmantelado em seu auge, quando adrenalina deslizava veloz por suas veias, quando ele mais queria, mais achava que ia conseguir e com a força dos milhões de fãs junto com ele. Foi nessa hora que Anderson o tirou para quase nada. Anderson nocauteou a melhor versão, mais rápida, mais afiada, mais sedenta, mais preparada fisicamente do Vitor Belfort. Não se deixem enganar por quem disser o contrário.

È normal torcer contra um campeão. Para alguns é divertido vê-lo cair de tão alto. Eu prefiro torcer pelo magnífico, pela grandeza, mas entendo e respeito que alguns se permitam certa mediocridade vez em quando. Torcer contra Anderson é comum. È da natureza do esporte esse fluxo de sensações envolvendo alguém extremamente bem sucedido, mas posso afirmar que todos que o vaiaram no dia da pesagem e na entrada do UFC 126 sofrem de alguma espécie de distúrbio.

Parto da premissa de quem paga mais de mil dólares para ver a luta ao vivo ou pague uma mensalidade ao UFC club para ter direito a, dentre outras coisas, ver as pesagens, deve ser fã de MMA. E MMA só existe hoje dessa forma sólida e bem sucedida por conta de lutadores como Anderson Silva. Muitos que começaram a gostar do esporte hoje, com quase dois UFCs por mês, não sabem que o esporte quase faliu e se arrastava para colocar um evento de três em três meses. Foram lutadores como Anderson, Sakuraba, Fedor, Wanderlei e muito poucos outros que ficaram ao lado do MMA quando ele estava ligado a aparelhos. Foi o magnífico de suas apresentações que ecoavam ao redor do mundo e faziam o esporte parecer muito mais importante do que realmente era na época. Hoje há vários bons lutadores e boas campanhas de marketing, mas tempos atrás só havia performance. A grande propaganda era a qualidade da luta. Era mais cru, mais cruel. Vaiar Anderson, Liddell, Couture e outros é vaiar o próprio esporte que ama. È se chamar de bobão, é não saber quem descobriu o Brasil. Ou é, no mínimo, ser bem ingrato.

Anderson entrou na alma de Belfort logo no dia da pesagem. Vitor não é santo, adora dar desculpa para suas derrotas. Disse textualmente que foi roubado na luta contra Ortiz quando comentarista do SporTV (realmente foi prejudicado, mas a expressão ?roubo? mostra que não teve nobreza na derrota), disse que o juiz interrompeu sua terceira luta contra Couture apenas por sangramento, quando na verdade estava sendo espancado sem esboçar reação. Mas é verdade que Vitor é um homem sério, apegado a família, vive fora de baladas e dessas vicissitudes a que muitos esportistas são afeitos. É um atleta profissional. Não ofende de maneira baixa, não xinga, não intimida. È um cara legal. Ele não esperava tanta agressividade e imponência vinda do campeão. Não se intimidou, mas Anderson jogou uma estrela ninja em sua psique.

Na hora da luta Vitor fez tudo o que falou que ia fazer, após um começo hesitante, partiu para cima, acertou dois socos quando Anderson começava a querer dançar, derrubou e já caiu soltando um cruzado cheio de maldade, forçou a luta como um grande lutador deve sempre fazer e teve o mesmo final de todos os que fizeram o mesmo. Acabou nocauteado, dormindo de olhos abertos. Tamanha foi a violência do chute e precisão nos dois golpes no chão que pode ter confundido as luzes do teto do estádio com a passagem para outra vida.

Anderson Silva presenteou mais uma vez uma maioria que insiste em querer vê-lo perder com um diamante. Reflete o insulto e as vaias com o fantástico. Transformou um chute bem conhecido em karatê, tae kwon do, capoeira e outras artes numa coisa única. Como a bola nos pés de Pelé deixava de ter vontade própria por respeito ao mestre.

O impacto desse chute só será realmente sentido daqui a uns dez anos, mas grandes ondas já começaram a sacudir a mídia nacional. Nunca foi tão comentado no Brasil um evento de MMA. Pessoas comentam no salão, na academia, no ponto de ônibus num boca a boca muito saudável antes exclusividade do futebol.

Estamos presenciando o último e mais magnífico ato de uma carreira grandiosa. Podemos assistir de pé, com o olhar fixo, ou sentados e vaiando. Cada um sabe o que mais lhe apetece a alma.

Jon Jones VS Ryan Bader

Da mesma maneira que Jon Jones afirma sentir que esse é seu momento, não sabe explicar, mas é como se sentisse que vai ganhar todas as lutas que fizer, posso afirmar que ainda escreverei muitas coisas sobre ele. Jones é um fora de série, não dá para medir apenas pelas sua credenciais. Já está bem além disso. Bader foi campeão da divisão 1 de wrestling e Jones apenas campeão na universidade. Mesmo assim Bader não conseguiu derrubá-lo e ainda foi dominado no chão como um iniciante. È o equivalente a um campeão estadual faixa azul de jiu-jitsu escovar um campeão mundial faixa preta em MMA. Pode acontecer é claro, desde que ele seja um gênio.

Jones é um caldeirão de influências. Treina e estuda tantas artes que sua mente ainda não consegue criar um padrão de luta. Vai dar um soco, muda de idéia no meio do caminho e vira uma cotovelada voadora. Seu cérebro parece ter mais capacidade de armazenamento que o normal. Parece que fica o dia todo na máquina de upload de habilidades do Matrix com aquela agulha encaixada na nuca. Simplesmente parece veloz demais, grande demais, inteligente demais, calmo demais, para qualquer peso meio pesado do mundo.

Percebi uma expressão de resignação no rosto de Shogun ao aceitar oficialmente a luta. Depois de se preparar para Rashad e saber que antes ofereceram a disputa para Rampage, pegar Jon Jones é como tirarem o sushi da sua frente, colocarem uma feijoada caprichada e deixarem para se virar com dois pauzinhos. Não vou dizer que o brasileiro não tem chances, qualquer pessoa com as valências mentais ainda intactas nunca descartaria Maurício Rua, mas nesse momento, Jon Jones parece simplesmente imbatível.

Bones fez Bader, invicto até então, parecer um lutador qualquer que nem sabia o que fazer no octagon ao finalizá-lo sem esforço no segundo round. Jones fica de pé, coloca as duas mãos junto à boca e abre os braços numa saudação de saltimbanco, de circo de Soleil, de David Coperfield. Ele sabe que o octagon é seu palco e o show está só começando.

Forrest Griffin VS Rich Franklin

Eu possuo extremo respeito por lutadores profissionais. Quem treina entende como esses caras são alguns dos maiores atletas do planeta, submetidos a alguns dos maiores regimes de treinamento suportáveis pelo corpo humano. Estar no topo, ou ter estado, é algo para se louvar e contar para os netos. È mais fácil escrever escrever cíticas num blog do que ser campeão como Forrest e Rich já foram. Mas quem, fora familiares, empresários e treinadores, realmente estava se importando com essa luta? Quem ganhar chega aonde e quem perder cai para onde? Para mim os dois são como o vovô que quer brincar com os netos de pique pega: ?café com leite?. È claro que são lutadores competentes que vendem caro as derrotas, deixam o adversário sempre moído, fazem combates movimentados. Mas simplesmente parece que eles saíram do eixo, eles desencaixaram do quebra cabeça. A luta deles deveria acontecer em feiras de MMA como a UFC Fan Expo. Depois tomariam banho e dariam autógrafos rindo, como se nada tivesse acontecido. Até porque para eles vencer ou perder não faz mais diferença. Se apaixonaram tanto pelo processo que perderam uma meta maior.

Foi uma luta movimentada entre um enorme Griffin e um pequeno Franklin. Vitória do primeiro que não tem uma performance a altura de seu nome faz quase dois anos. A melhor coisa que Forrest Griffin fez nesse tempo foi seu excelente livro Got Fight.

ÚLTIMO ROUND

O UFC insiste em trazer estrelas asiáticas apenas quando elas estão em declínio. Kid Yamamoto está longe do auge de sua carreira, mas poderia ter vencido com facilidade Demetrious Johnson. Não venceu. Lutou de modo apático como Aoki lutou no Strikeforce, como Akyiama vem lutando, Gomi e Sakurai. Parece que colocam alguma coisa na água dos japoneses quando lutam nos EUA. Ou será exatamente o contrário? Impossível responder. Dana não ligou já que Kid deve ter sido contratado para fazer as pessoas curtirem a página do UFC no Facebook.

Sobre Donald Cerrone nas preliminares deixarei aqui meu silêncio em protesto. Basta dizer que ganhou o prêmio de luta da noite.

twitter.com/nicoanfarri



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